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Sob o olhar das máquinas

Apesar de envolver altos custos na saúde suplementar, a cirurgia robótica promete recuperação rápida e mais qualidade de vida ao público feminino

POR ELAINE LISBÔA

Falar de saúde feminina está ultrapassando os muros do Outubro Rosa. As mulheres desempenham papéis cruciais na sociedade e, cada vez mais, assumem as responsabilidades do cuidado com a família e os negócios. Mas esta sobrecarga de trabalho tem afetado a saúde.

Segundo o Índice Global de Saúde da Mulher, o fardo econômico e psicológico afetou particularmente esse público. Elas estão mais estressadas, preocupadas, tristes e irritadas em comparação a qualquer outro momento da última década. O estudo mostra ainda que as mulheres com acompanhamento médico tinham expectativa de vida média de dois anos a mais, no entanto, cerca de 1,5 bilhão não teve acesso a cuidados preventivos.

“Era comum acompanharmos casos de mulheres (de todas as idades e classes sociais) que deixavam o cuidado pessoal sempre por último e focavam no filho, no marido, nos negócios, mas isso tem mudado. Cada vez mais temos visto o tratamento preventivo e, assim, a descoberta precoce de um câncer, por exemplo, o que pode evitar cirurgias. O ideal é fazer sempre o preventivo”, aponta a superintendente regional Comercial Varejo SP Capital da SulAmérica, Adriana Lins.

Depois de duas semanas a mulher já consegue retomar às atividades normais. Em uma cirurgia aberta, por exemplo, dependendo do tamanho da incisão do corte, a paciente fica praticamente dois meses em afastamento”.

Luiz Gomes, Cirurgião

Um auxílio que chegou para ficar

As novas tecnologias estão vindo com tudo para ajudar as mulheres a cuidarem da saúde e contarem com uma recuperação mais rápida, através de procedimentos menos invasivos. É o caso da cirurgia robótica. Ela minimiza os problemas, principalmente em tratamentos ginecológicos.

A primeira cirurgia robótica no Brasil foi feita há 16 anos e, com a expansão dos aparelhos, nos últimos cinco anos foram realizados mais de 80 mil procedimentos, o que significa aumento de 417% na comparação à primeira década de uso. Também aumentou o número de robôs por aqui. Em 2023, o País contava com 111 robôs (em 2018 eram 51), é o que mostra uma publicação da Associação Médica Brasileira (AMB).

“O principal público que tenho atendido com cirurgia robótica está relacionado a endometriose. São mulheres que tiveram perda na qualidade de vida, devido quadro de muita dor, principalmente no período menstrual, ou que tiveram alteração de hábito intestinal relacionado à menstruação. Além dessas, temos pacientes com obesidade, hérnias abdominais e diástase, mas hoje o foco principal da equipe é o tratamento da endometriose”, menciona o cirurgião do aparelho digestivo, Luiz Gomes.

O médico explica que a cirurgia robótica entra na categoria dos procedimentos minimamente invasivos, que reduzem os traumas cirúrgicos e tornam a recuperação mais fácil e rápida, além de oferecer uma precisão maior ao cirurgião, com uma visualização em até 15 vezes das estruturas e em 3D. “As pinças do robô, que são comandadas de maneira remota, são mais estáveis do que o próprio braço do cirurgião.”

E todas essas vantagens refletem na paciente. “Ela tem menos dor no pós-operatório, consegue levantar da cama mais rapidamente, tem uma alimentação precoce, a parte intestinal volta a funcionar, ou seja, depois de duas semanas a mulher já consegue retomar às atividades normais. Em uma cirurgia aberta, por exemplo, dependendo do tamanho da incisão do corte, a paciente fica praticamente dois meses em afastamento”, compara Gomes.

Esse foi o caso da bancária Renata Lima Crivelaro, que precisou fazer uma cirurgia ginecológica e optou pelo uso da robótica. Renata conta que sentia fortes dores no período menstrual, mas julgava ser normal. “Tive endometriose durante alguns anos e avalio que recebi um diagnóstico tardio, porque eu mesma demorei para dar atenção aos sintomas.”

Ao fazer os exames, Renata descobriu que estava com o quadro de endometriose avançado, nível 4, e precisava de uma cirurgia. A doença tinha tomado o útero, a bexiga, o apêndice e parte do intestino. “Foi uma cirurgia bem complexa, por meio da robótica, com a participação de um gastro, de um ginecologista e da equipe deles. Pude perceber nos primeiros dias a mudança e digo que foi uma mudança de vida. Hoje, tenho um outro ânimo e mais qualidade de vida.”

Cinco meses após a cirurgia, Renata conseguiu viajar para a Espanha e andou 800 quilômetros, em 33 dias, no Caminho de Santiago. “Foi uma cirurgia muito bem-sucedida, uma recuperação muito tranquila, que me permitiu em pouco tempo estar de volta às atividades normais.

Pude perceber nos primeiros dias a mudança e digo que foi uma mudança de vida. Hoje, tenho um outro ânimo e mais qualidade de vida”.

Renata Lima Crivelaro, Bancária

Altos custos

Mas a cirurgia robótica ainda não é uma realidade nos planos de saúde. O procedimento não consta no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e, consequentemente, não estaria passível de cobertura. Além do desafio dos altos custos da saúde suplementar.

O modelo de robô mais utilizado é o Xi, comercializado pela Intuitive (EUA), com valor estimado em US$ 3 milhões. Deve-se levar em consideração ainda a manutenção e a revisão preventiva mensal que, segundo o Instituto de Cirurgia Robótica, gira em torno de R$ 80 mil.

A cidade de São Paulo tem cerca de 50 robôs, um deles está no Hospital das Clínicas – um dos poucos do Sistema Único de Saúde (SUS) a ter contato com essa tecnologia. “Na parte privada, quase todos os grandes hospitais têm a cirurgia robótica. O plano de saúde não cobre ainda, por isso, normalmente passamos a opção ao paciente e, se interessar, ele paga uma taxa ao hospital. Em casos de endometriose, existem hospitais que chegam a isentar esta taxa”, destaca Gomes.

A coordenadora da Comissão de Saúde Suplementar e Odontológico do Sincor-SP, Vanessa Mendes, diz que o grande desafio está nos altos custos. “A cirurgia robótica tem uma expectativa, até 2025, de crescer 20% e as companhias estão sendo preparadas para isso. O que precisamos é, realmente, ter uma visão 360º, porque não apenas a questão do alto custo da tecnologia vem impactando, mas a má utilização.”

Em razão do plano funcionar como um seguro coletivo, quando um beneficiário precisa utilizar, todos os outros pagam a conta, e um dos maiores vilões nesta história é o uso indiscriminado pelos pacientes, com repetições desnecessárias de exames, idas sem necessidade a prontos socorros e consulta com diversos médicos para tratar a mesma situação.

Além da má utilização, o setor ainda tem o desafio das fraudes. De acordo com a Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), somente em 2022, a saúde suplementar sofreu prejuízo de R$ 4 bilhões com a realização de reembolsos frauduletos. “Esses índices fazem as operadoras recalcularem a rota. A tecnologia, como a cirurgia robótica e o sistema de database que integra todos os dados, são implantações assertivas, mas o que precisamos mesmo é adequar a utilização da assistência médica para facilitar a incorporação dessas inovações. Então, o trabalho que as companhias têm que fazer e o consumidor tem que reaprender é utilização do caminho da prevenção”, indica Vanessa.

O que precisamos é, realmente, ter uma visão 360º, porque não apenas a questão do alto custo da tecnologia vem impactando, mas a má utilização”.

Vanessa Mendes, coordenadora da Comissão de Saúde Suplementar e Odontológico do Sincor-SP

A prevenção que beneficia o coletivo

O uso consciente dos planos de saúde dependente também dos corretores de seguros. Os profissionais podem indicar caminhos sustentáveis para os beneficiários utilizarem os planos de maneira equilibrada, investindo na prevenção de doenças e melhorando os custos do serviço.

“Sou uma pessoa realista, mas muito otimista. A primeira coisa que precisamos levar, nós que somos do setor, é esse nível de conscientização para os nossos corretores, em primeiro lugar. É através deles, que fazem o contato com o beneficiário, que podemos mostrar às pessoas a importância de utilizar o plano de saúde de maneira consciente”, afirma Adriana Lins, da SulAmérica.

E não tem para onde fugir. Luiz Gomes diz que a tecnologia veio para ficar e só cresce a cada dia. “Já existem profissionais fazendo cirurgias a distância por 5G. Para se ter uma ideia, conheço médicos de Orlando que fazem cirurgia na China. Então, os casos complexos, em que o paciente quer operar com um médico mais especializado, é possível conseguir. É a tecnologia trazendo mais benefícios para o paciente, que é o mais importante”, conclui o cirurgião.

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